MUSGO QUE SOBREVIVEU 9 MESES NO ESPAÇO PODE SER A CHAVE PARA LEVAR A VIDA A MARTE

 

Um experimento científico conduzido por pesquisadores japoneses pode transformar radicalmente nossa compreensão sobre a resistência da vida terrestre e abrir novos caminhos para a colonização de outros planetas. Um musgo comum da Terra, o Physcomitrium patens, surpreendeu a comunidade científica ao sobreviver 283 dias totalmente exposto ao ambiente hostil do espaço sideral — sem proteção, sem atmosfera e sob radiação extrema.

A descoberta, publicada na revista científica iScience, revela que a planta não apenas resistiu às condições letais do espaço, como também manteve a capacidade de germinar e crescer normalmente após retornar à Terra. O resultado sugere que organismos simples, como musgos, podem desempenhar papéis fundamentais na criação de ecossistemas extraterrestres, especialmente em futuras missões à Lua e Marte.

A Plantinha Comum que Virou "Superorganismo" no Espaço


O protagonista do estudo é um musgo conhecido por crescer em áreas úmidas, troncos, rochas e até calçadas. Mas o que parecia uma planta delicada demonstrou um nível de resistência nunca antes visto. O experimento, liderado pelo professor Tomomichi Fujita, da Universidade de Hokkaido, buscava entender como formas de vida terrestres reagem a longos períodos de exposição direta ao ambiente espacial.

Para isso, amostras de diferentes estruturas celulares do musgo, incluindo os esporófilos — estruturas que envolvem e protegem os esporos — foram enviadas para a Estação Espacial Internacional (ISS). A equipe selecionou essas estruturas por sua conhecida robustez em condições extremas na Terra, mas nenhum dos pesquisadores imaginava que elas resistiriam por quase nove meses no espaço aberto.

As amostras foram fixadas no módulo japonês Kibo, na parte externa da ISS, onde ficaram expostas diretamente ao vácuo espacial, aos constantes ciclos de calor e frio, à radiação ultravioleta e à microgravidade.

Quando retornaram à Terra, os cientistas iniciaram análises para verificar a integridade das células. O resultado foi impressionante: mais de 80% dos esporos ainda conseguiam germinar. Em outras palavras, a planta não apenas sobreviveu, mas estava pronta para iniciar um novo ciclo de vida.

O Espaço: Uma Tortura Constante Para Seres Vivos

Para compreender a magnitude deste resultado, é importante saber o que uma planta — ou qualquer organismo — enfrenta fora da proteção da atmosfera terrestre:

1. Vácuo total

No espaço, a ausência de pressão causa rápida perda de água e danos irreversíveis em células vivas. A maioria dos organismos morreria em segundos.

2. Radiação solar direta

Sem a camada de ozônio, os raios ultravioleta atingem diretamente as estruturas biológicas, destruindo DNA, proteínas e membranas.

3. Temperaturas extremas

Quando exposta ao sol, a superfície pode atingir cerca de 120°C; na sombra, pode despencar para -150°C.

4. Oscilações térmicas bruscas

O ambiente muda de calor extremo para frio intenso repetidas vezes — algo que danifica profundamente tecidos biológicos.

5. Microgravidade

A ausência de gravidade afeta fluídos, metabolismo e distribuição interna de nutrientes.

Apesar de tudo isso, o musgo demonstrou uma resistência que extrapola qualquer expectativa biológica.

Por Que este Musgo é Tão Forte?

Os pesquisadores identificaram quatro fatores que explicam como o Physcomitrium patens conseguiu enfrentar condições tão severas:

Escudos naturais contra radiação

Os esporófilos possuem camadas celulares densas capazes de bloquear grande parte da radiação ultravioleta.

Desidratação sem morte celular

O musgo consegue entrar em um estado de dormência extrema ao perder água, reduzindo seu metabolismo a praticamente zero, o que evita danos estruturais.

Reparos eficientes de DNA

Mesmo quando parte do DNA é danificado pela radiação, a planta ativa mecanismos internos altamente eficientes de reparo.

Proteínas protetoras

O musgo produz proteínas especiais que estabilizam suas células em temperaturas extremas.

Essas características, comuns em ambientes terrestres severos, acabaram se mostrando perfeitas para a sobrevivência no espaço.

Como o Experimento Foi Feito

Antes de enviar as amostras ao espaço, os cientistas as submeteram a testes rigorosos na Terra, incluindo:

  • Exposição prolongada a radiação UV
  • Congelamento a -80°C
  • Aquecimento a 60°C
  • Testes de resistência à desidratação

Os esporófilos foram os mais resistentes e, por isso, escolhidos para o experimento espacial.

Na ISS, as amostras ficaram no exterior do módulo japonês Kibo, uma área destinada a experimentos que precisam de exposição direta ao espaço. Entre fevereiro e novembro de 2022, o musgo ficou preso em plataformas especiais, sem proteção, enfrentando as condições extremas por quase 300 dias.

Ao retornar à Terra, os pesquisadores observaram que apenas a radiação ultravioleta causou danos significativos, especialmente na destruição de clorofila. Ainda assim, mesmo com parte da estrutura comprometida, a capacidade de germinação permaneceu.

O Que Mudou Para a Colonização de Marte


A descoberta tem implicações diretas para futuras missões espaciais:

Musgos podem ser os primeiros colonizadores

Eles podem iniciar a formação de solo, converter gás carbônico em oxigênio e preparar ambientes para plantas mais complexas.

Podem servir como escudos contra radiação

Camadas espessas de musgo poderiam proteger módulos habitacionais e laboratórios em Marte, onde a radiação é intensa.

Podem integrar sistemas de suporte de vida

Por exigirem poucos nutrientes, musgos podem ser cultivados em ambientes controlados para reciclar ar e água.

Podem compor bioestruturas

Pesquisadores cogitam, no futuro, produzir “tijolos” orgânicos reforçados com musgo para construção de habitats.

O Futuro da Pesquisa

A equipe japonesa já planeja novos experimentos:

  • Exposição ainda mais longa no espaço
  • Testes com outras espécies resistentes
  • Experimentos diretos na superfície da Lua
  • Criação de microecossistemas com musgos e bactérias
  • Desenvolvimento de habitats vivos para missões prolongadas

Os pesquisadores estimam que, nas condições certas, o musgo poderia sobreviver até 15 anos no espaço sem perder a capacidade de germinar.

Uma Lição Sobre a Resistência da Vida

A descoberta reforça algo que a ciência já suspeitava, mas nunca havia comprovado com tanta clareza: a vida é incrivelmente resistente. Organismos simples, muitas vezes ignorados, podem ser a chave para garantir a sobrevivência humana fora da Terra.

O musgo Physcomitrium patens mostrou que a vida não apenas resiste — ela se adapta, se protege e encontra maneiras de persistir mesmo nos ambientes mais extremos.

Essa pequena planta, antes vista como comum, pode ser o ponto de partida de uma nova era da exploração espacial, em que musgos serão os primeiros habitantes de Marte antes dos humanos.

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